Um Cão Andaluz – Vagão Alternativo
Título original: Un Chien Andalou
País: França
Ano: 1929
Duração: 17 Minutos
Distribuição: Les Grands Films Classiques
Estreia: 6 de Junho de 1929 (França)
Equipa técnica:
Realização: Luis Buñuel, Salvedor Dali
Produção: Luis Buñuel, Pierre Braunberger
Argumento: Luis Buñuel, Salvador Dali
Música: Richard Wagner
Fotografia: Albert Duvenger
Montagem: Luis Buñuel
Direcção Artística: Luiz Buñuel
Elenco: Simonne Mareuil (Mulher), Pierre Batchef (Homem), Luis Buñuel (Homem com a lâmina), Salvador Dalí (Seminarista), Marval (Seminarista), Jaime Miravilles (Seminarista gordo), Robert Hommet (Jovem), Fano Messan (Jovem andrógina)
Falar de “Um Chien Andalou” é falar de surrealismo, é falar de abstrato, é conciliar um pouco do inesperado com a falta de sentido total em uma linha cronológica audiovisual…
Será mesmo?
Bom, meus pequenos seres humanos providos de carbono e amoníaco, para quem não está entendendo absolutamente nada de nada e com vontade de sair correndo, vamos por partes; Um cão Andaluz foi uma parceria entre Salvador Dalí (sim, o pintor surrealista mais famoso da história) e Luis Buñuel (referência na área cinematográfica experimental). Ambos estudavam na faculdade de Madrid e fizeram amizade por seus gostos, assaz, semelhantes. A proposta do curta era a união das lembranças de sonhos dos dois, quais não importavam o sentido ou significado, simplesmente precisavam causar alguma reação ou emoção para ambos. E em 1929 nascia O cão Andaluz; Buñuel e Dali foram à estreia com pedras nos bolsos para se protegerem da reação dos espectadores, que, por surpresa, aplaudiram o filme de pé.
Anos depois, o curta virou referência como abertura do cinema experimental, não que não houvessem outros pela época, mas este teve uma força de popularidade imensa e hoje é cultuado pelo público “Cult”. Quem pegou a época boa da MTV vai se lembrar de uma vinheta que o olho de uma moça era cortado por uma navalha… Exato! É a cena de abertura do filme.
Maaaaaaaassss; qualquer um que pesquisa sobre o filme vai encontrar estas informações, o que venho fazer aqui é uma analogia sobre e filme e quebrar o tabu de “Não tem sentido óbvio”
Mas, primeiro, convido-lhes a assistir o curta ^^
Agora; A parte divertida: Vamos comparar o Criador, a Criatura e o Porquê da criação…
O que pouca gente sabe, é que nesta mesma faculdade em Madrid, onde Dalí conheceu Buñuel, conheceu também Federico Garcia Lorca, um jovem escritor nascido em Andaluzia, uma cidadezinha da Espanha. (Hum… prevejo conspirações pela cidade, logo vão entender que elas fazem sentido.).
Sim, meus queridos, eles se apaixonaram e tiveram um caso fervoroso durante seus anos letivos, um jurava ao outro a vida entregue e a reciprocidade da relação era coisa linda de se ver. (E podem ver cinematografado, assistam Little Ashes, de 2008)
Ok. Mas, como a vida prega peças, Buñuel convenceu que o talento de Dalí era demais para abrir mão, pois se soubessem de sua opção sexual isso arruinaria sua carreira, na época, a homossexualidade era quase como um crime na França.
Salvador Dalí se mudou com Buñuel para alavancarem suas carreiras e buscar fama, seguindo então tudo o que era necessário para conseguir na época. Já Lorca, não ligava para a fama em si, incontestavelmente, fazia suas aparições e a Espanha já caminhava para louvá-lo com orgulho em breve. Porém, com fortes ideologias comunistas, Lorca foi taxado como alvo por grupos que não defendiam as mesmas ciências, isso fez com que fosse assassinado em Agosto de 1936.
Um Chien Andalou foi lançado em 1929, como um presente para Federico Garcia Lorca, de Dalí, que tentou se adaptar à “vida normal” e sempre sofreu amores por seu cão de Andaluzia, dizia cão, pois era como um andejo sem rumo que sempre voltava para casa.
Foi como uma resposta inquietante do presente “Ode a Salvador Dalí” que Lorca escreveu em 1926.
Vamos agora fazer com que esse abstracionismo pouco explicado fique transparente e nítido aos vossos olhos, desvendando sua simbologia seguindo sua sinopse:
-UM HOMEM AFIA UMA LÂMINA E CORTA O OLHO DE UMA MULHER, IMITANDO UMA NUVEM QUE AO PASSAR EM FRENTE À LUA A PARECE CORTAR EM DUAS; Uma das analogias mais óbvias a se entender: “Não se prenda à visão”. Pois tudo que irá ver a seguir será muito mais do que suas retinas podem captar.
-UM HOMEM, VESTIDO COM PEÇAS DE ROUPA DE FREIRA E UMA CAIXA AO PEITO CAI DA BICICLETA, NA ESTRADA, PERMANECENDO IMÓVEL; Dalí sendo obrigado à correr contra seus instintos e reais desejos, dando-se por vencido pela exaustão de não entender muito bem o sentido daquilo tudo. Uma crise existencial perante suas escolhas e prioridades. A caixa representa seu maior segredo, suas reais vontades e verdades junto ao passado.
-A MULHER LEVA-O PARA CASA, DISPONDO SOBRE A CAMA PEÇAS DE ROUPA, QUE RETIRA DA CAIXA QUE ELE TRAZIA AO PEITO; Dalí conhece uma companheira e, na verdade, as roupas eram aquelas peças femininas que estavam por cima da masculina, ela se põe a observa, e se perceberem a única peça que some entre um take e outro é uma gravata (A única peça masculina dentre as femininas), ou seja, a companheira de Dalí sabe de tudo, porém entende a busca por seus sonhos, tentando muda-lo.
-O HOMEM OBSERVA A SUA MÃO CHEIA DE FORMIGAS; Na França, uma mão com formigas significa fúria, raiva… E era exatamente o que Dalí sentia de si mesmo.
-A IMAGEM MOSTRA A NUVEM DE FORMIGAS TORNAR-SE A AXILA PELUDA DA MULHER, E DEPOIS UM OURIÇO; As brincadeiras doentias que a mente de Dalí fazia para tentar se conformar com seu fado de mentiras.
-DA SUA JANELA O CASAL VÊ UMA JOVEM ANDRÓGINA A MEXER COM UM PAU NUMA MÃO CORTADA, CAÍDA NA ESTRADA, PERANTE O OLHAR DOS TRANSEUNTES. ESTA MÃO É POSTA NUMA CAIXA POR POLÍCIA E DADA AO JOVEM, QUE É ATROPELADO POR UM CARRO; Dalí está eufórico demais observando esta cena… O (A) jovem trata-se de Federico Garcia Lorca, e a mão que insistentemente mexia era “A escolha” que o mesmo tomaria por seu futuro. Dalí torcia para seu amor “abrir mão” dos sentimentos e omitir seus ideais e opções para ter fama e sucesso, porém, o fato do de Lorca ter guardado a mão em sua caixa (Idêntica a de Dalí) significa que, mesmo que ninguém saiba sobre Salvador, ele não se importa que saibam dele. O fato de ele ser atropelado por um carro é o pensamento de Dalí, sabendo que ele vai sofrer demais por isso.
-EM CASA, O HOMEM TORNA-SE AGRESSIVO COM A MULHER, APALPANDO-A SOBRE A ROUPA E IMAGINANDO-A NUA. ESTA FOGE, E ELE PERSEGUE-A CARREGANDO CONSIGO AS TÁBUAS DOS DEZ MANDAMENTOS, DOIS SEMINARISTAS E DOIS PIANOS COM UM BURRO MORTO EM CIMA; Cena magnífica, a minha preferida! Não pela nudez >.< mas pelo corte dos pianos e tudo mais, Dalí está se obrigando a mudar, porém carrega um enorme peso (Pianos) nas costas, e por saber que isso é contra as “leis da sociedade e de Deus” (Seminaristas), cala-se em segredo absoluto, os burros mortos simbolizam como ele está cansado de se enganar.
-A MULHER FOGE E COM A PORTA ENTALA-LHE A MÃO, A QUAL ESTÁ CHEIA DE FORMIGAS; O sinal de como a mulher está cansada das brigas internas de Dalí.
-NA CAMA AS ROUPAS ANTES DISPOSTAS DÃO LUGAR AO HOMEM. SURGE UM SEGUNDO HOMEM, QUE LHE ARRANCA AS PEÇAS DE ROUPA DE FREIRA E AS ATIRA PARA A RUA, MANDANDO-O DEPOIS FICAR VIRADO PARA A PAREDE. O SEGUNDO HOMEM RELEVA-SE COMO SENDO O PRIMEIRO, E DÁ-LHE DE SEGUIDA DOIS LIVROS. ESTES TORNAM-SE PISTOLAS E O PRIMEIRO HOMEM MATA O SEGUNDO COM ELAS. O CORPO MORTO CAI EM CIMA DE UMA MULHER NUA, NO CAMPO, ONDE É DESCOBERTO E LEVADO EM CORTEJO; Buñuel, que desde o início o influenciou, chega para dar um “tapa na cara” de Dalí, fazendo com que ele desista de si para seguir sua fama, (O atirar das roupas de freira e de sua caixa pela janela). Porém, essa reluta segue muito mais, quando Dalí se propõe a entrar no jogo, porém, desta vez, mantendo suas brigas internas para si próprio. Já o corteja, podemos ver como uma “previsão” de como Lorca morreria: Nu, com os olhos vendados e com um tiro no anus. (Faltou a venda), pois assim morriam os homossexuais comunistas assassinados.
-EM CASA A MULHER VÊ, NA PAREDE, UMA TRAÇA COM UMA CAVEIRA DESENHADA. VÊ DEPOIS O HOMEM, SEM BOCA, E AO PINTAR OS LÁBIOS A MULHER VÊ OS PÊLOS DAS SUAS AXILAS DESAPARECER E SURGIR A COBRIR A BOCA DO HOMEM. ELA DEITA-LHE A LÍNGUA DE FORA E SAI, ENCONTRANDO-SE NA PRAIA COM OUTRO HOMEM QUE A ESPERAVA E A REPREENDE PELO ATRASO; Os últimos conflitos entre Dalí e sua companheira, e, na verdade, o “outro homem”, é o próprio Dalí, mas um Dali mudado, ao menos ao ver de sua companheira, deixa isso nítido ao zombar de suas próprias roupas antigas que remetiam a sua opção sexual e a caixa, agora, quebrada.
-BEIJAM-SE E CAMINHAM À BEIRA MAR, ENCONTRANDO AS ROUPAS E CAIXA ANTES ATIRADAS FORA; A esperança de que isso dê realmente certo e que ambos tenham uma vida de sucesso e felicidade juntos.
-COMO ÚLTIMA CENA VEMOS O CASAL ENTERRADO NA AREIA ATÉ AO PEITO; A realidade, onde ambos mentiam para si e para o outro, convivendo eternamente com essa mentira.
^^ Espero que tenham gostado passageiros!
Continuem sempre curiosos e de olhos abertos, porém com todos os outros sentidos funcionando! (Inclusive o abstracionismo inconsciente que abrange as cadeias de ciência infindável proveniente da auto conclusão e reflexão de pré-entendimento 🙂
Deixo a todos um abraço bem apertado no pâncreas e um forte chacoalhão no fluído encefálico e até a próxima 😉
(Se tiverem sugestões de temas, deixar nos comments ^^)