Falando de deus para crianças
Olá, seres providos de carbono e amoníaco, como vão?
Um tempinho atrás me peguei pensando: E quando minha filhinha me perguntar quem é esse “Deus” que tanto falam?
Logicamente que eu não quero prendê-la a nenhum dogma implantado por essa raça temente à punição de sabe-se lá o que, mas também não quero traumatizá-la, é como contar sobre o Papai Noel, Coelhinho da Páscoa, Fada do Dente, sabe… É mais do que importante para a criança estimular a imaginação e tão poucas coisas são tão puras quanto o brilho nos olhos desses serzinhos que o único e verdadeiro pecado seria acabar com seus sonhos.
Por isso, junto com o grande parceiro René Pérez, mentalizei uma decorrente prosa sobre isso e decidi compartilhar com vocês e, bom, aí vai…
————————————————————————————
— Papai! Papai! O que tem no céu?
— No céu, filha? Como assim, no céu?
— É papai, ele é muito grande! O que tem guardado lá?
— Ideias, minha Pequena.
— Ideias?
— Isso mesmo. Ideias. Toda e qualquer ideia que possamos ter…
Muito além de qualquer meridiano, como pressuposto imaginário, um tanto acima, bem mais do que pensado, onde nenhuma onda consegue alcançar, muito acima mesmo! Talvez nem consiga imaginar. Fica bem perto do início e bastante longe do final. Entre dois vales, o céu que vemos é rachado no meio e lá existe um campo onde se pode ver as estrelas de muito mais perto… Lá há uma pequena fábrica, porém imensa, onde vive um velho sábio que sobrevive porque pensa.
Conhecedor de múltiplas manobras e apto em todas as ciências, este velho aproveita não só a matéria bruta, mas todas as sobras e lhes aplica consciência. Não importa se à frente só sobrou deserto, este velho utiliza o que já se via morto. Ele tem visão telescópica, pés de tartaruga, língua de camaleão e olfato de lagarto.
O velho é cirurgião do tempo e a sangue frio opera todos os momentos. Todos os minutos que se perdem por aí não são problema, pode ele recuperá-los com um bisturi. Estende os segundos para que pareçam mais largos, também faz transplantes de momentos amargos. E se continua a amargura e nada pode consolar, existe sua anestesia para a maior parte da dor fazer cessar…
Se ele quiser ter um novo ciclo de vida, pode se renovar a cada certo tempo.
Não come muito, pois, como já disse, sua corrente de sangue é fria e se alimenta de moscas que vivem somente um dia. E se não há comida, sem problemas, ele se alimenta de seu próprio corpo como os polvos, não morreria nem se devorasse seu corpo inteiro, pois se regenera tão rápido como uma salamandra.
Podem passar os anos, mas para ele o tempo não faz diferença, é imortal assim como a maioria das crenças. Seus ossos são de árvore, por isso dura tanto. Esse velho sábio nunca se esquece de nada porque tem sua memória congelada, suas recordações estão inteiras, às preserva com gelo seco a oitenta graus abaixo de zero.
Sabe que a repetição de uma ação é a técnica mais efetiva para a prolongação, por isso ele repete até que esteja entediando e assim segue a mais de nove mil e quinhentos anos vivendo. O melhor é que nunca passa de novo pelo mesmo problema, de tanto repetir aprendeu todos os seus erros…
Para o velho é como um abismo, viver não é tão bonito quando se vive todos os dias sempre o mesmo. Ele gostaria de poder fazer algo distinto, pois repetir-se e controlar o tempo já faz por instinto. Já até tentou descansar um pouco ou mesmo procurar alguma forma de aposentar-se, mas até se faltar oxigênio ele respira de sua maneira, porque quando as grandes ideias são descobertas, renovam todas as suas células mortas.
Por isso eu digo, filha, elas se fazem eternas quando querem, sempre vivem e nunca morrem, quando dormem, podem até ser indefesas, mas despertam quando as pensa. Quando atacam, não há quem defenda, as mais valiosas nunca estarão à venda. Alcançam tudo o que desejar… Assim, tão grande são as ideias.
— Entendi… Acha que eu posso ter uma grande ideia algum dia, papai?
— Eu tenho certeza, filha.
— Hum… Nós podemos visitar esse velhinho?
— Talvez… Mas trate de dormir agora.
— Tudo bem, boa noite, papai.
— Boa noite, Pequena… Prepare ideias para amanhã, hein…
— Amo você.
— Também te amo, bons sonhos…
———————————————————————————— Sued, embasado por construção de René Pérez Joglar.
Bom, por hoje é isso ^^
Bom sonhos.
Hasta.